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N Este símbolo representa ódio, o caranguejo, a cor preta, e o ébano.
O Este símbolo representa alegria, o golfinho, a cor azul-celeste, e a safira.
P Este símbolo representa medo, o coelho, a cor violeta e o rubi.
Q Este símbolo representa fé, a lagarta, a cor azul-turquesa, e a pedra turquesa.
R Este símbolo representa sofrimento, o chacal, a cor prata, e o elemento prata.
S Este símbolo representa felicidade, o cão, a cor rosa, e o mármore.
T Este símbolo representa perseverança, a tartaruga, a cor verde-mar, e a água.
U Este símbolo representa intuição, a serpente, a cor azul-claro, e a chuva.
V Este símbolo representa insensatez, o macaco, a cor amarela, e o marfim.
W Este símbolo representa amor familiar, o cavalo, a cor castanho-claro, e o couro.
X Este símbolo representa bravura, o leão, a cor roxa, e o diamante.
Y Este símbolo representa paciência, a vaca, a cor âmbar-amarelo, e a pérola.
Z Este símbolo representa desejo, o javali, a cor vinho, e o mineral granada.
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Os Penhascos da Lógica
Dentre os mais fascinantes artefatos deixados pelos Ancestrais estão os penhascos da lógica. Os penhascos têm esse nome por causa de uma série de charadas escritas na encosta dos desfiladeiros desde a sua base na praia da Ilha da Montanha Sagrada até a cidade dos Senhores do Vento. Esculpidas cuidadosamente em rocha sólida, fica ao encargo do observador questionar-se qual seria o propósito ao qual as palavras servem. A partir do pergaminho antigo que faz referência aos penhascos, pode-se determinar que os enigmas no desfiladeiro eram parte de um elaborado mecanismo desenhado para proteger aqueles que residiam no topo do penhasco contra os seres indesejáveis que porventura chegassem via mar. O mecanismo pode ter servido como uma espécie de sistema de alarme projetado para alertar aqueles no topo do desfiladeiro que um de seus irmãos solicitava entrada, ou quiçá levasse a câmaras secretas no interior da própria rocha. Seja qual fosse o propósito dos penhascos, eles obviamente foram criados para dar acesso somente àqueles versados nos segredos da cultura dos Ancestrais e por essa razão eles permanecem, infelizmente, irresolutos até os dias de hoje.
As traduções dos trechos a seguir foram extraídas do pergaminho dos penhascos da lógica e poderão ajudar o leitor a compreender toda a mística que cerca esse artefato.
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O primeiro desafio está ligado ao seguinte verso: “Somente aqueles puros de coração serão capazes de subir ao CUME dos penhascos da lógica.”
O terceiro desafio: “As Pedras da Furtividade,” está associado a esta charada:
Quatro homens estão em fila a caminhar,
O Terceiro certamente há de despencar,
O resto, em ordem, é preciso movimentar,
O Último, o Primeiro, e o Segundo Lugar.
O quinto desafio: “Somente aqueles da mais alta ordem poderão vencer a ALTURA dos penhascos da lógica.”
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As Catacumbas
As catacumbas, outro remanescente da cultura dos Ancestrais, são tragicamente inacessíveis aos visitantes de hoje. As catacumbas abrigavam as câmaras mortuárias dos Ancestrais, e dizem que foram desenhadas como um gigantesco labirinto. Para proteger suas tumbas dos saqueadores, os Ancestrais instalaram armadilhas letais dentro das catacumbas e as encheram com becos sem saída, corredores identicamente confusos, e salas onde conhecimentos secretos são necessários para progredir adiante.
Os Senhores do Vento chegaram perto de dominar os segredos das catacumbas alguns anos atrás, quando um minotauro, afeiçoando-se imediatamente à escuridão do funesto ambiente, decidiu fazer dele sua morada. Num primeiro momento, o reino tentou reaver o artefato de sua custódia, porém, em meio aos perigos das catacumbas e à figura traiçoeira do minotauro, as perdas tornaram-se demasiado grandes para dar continuidade à luta, e o minotauro sagrou-se vencedor
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dessa contenda. Desde então, as catacumbas permaneceram interditadas. Uma das maiores tristezas do reino é que, a cada ano, o minotauro escolhe alguém que deverá lhe ser entregue, como forma de um sacrifício vivo, a fim de que ele não emerja das catacumbas para atacar a cidade.
As catacumbas ilustram bem o obsessivo interesse dos Ancestrais pela morte. De fato, isso parece ser inerente a esta parte do mundo, posto que os atuais habitantes das Ilhas Verdes também possuem elaboradíssimos rituais de morte, como eu demonstrarei mais adiante. As catacumbas eram obviamente um lugar de alta reverência para os Ancestrais, como mostra uma mensagem esculpida em uma antiga tabuleta que outrora adornava os seus portões de entrada:
Três rosas dispostas ao longo do chão,
Uma foice para aqueles que as cortarão,
Uma coroa, um pombo, ó raça celestial!
Teus ossos santificam este funesto local.
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PARTE VI A Ilha da Fera
A Ilha da Fera, tempos atrás, era chamada de Ilha da Floresta. Era um local de incontáveis bosques verdejantes, lagoas majestosas, e fauna abundante. Costumava ser utilizada como ponto de recreação preferido para vigorosas caçadas protagonizadas pela família real e pelos esportistas da região, e por essa mesma razão a ilha foi deixada inabitada. Cenas recordativas desse tão prezado passatempo vivido naquele belíssimo cenário ainda podem ser contempladas em inúmeras tapeçarias e pinturas locais.
Conta a história que, uma noite, os residentes de outras ilhas podiam ver luzes mágicas ao redor da Ilha da Floresta. No dia seguinte o rei, naquela época o Rei Aliphim, conduziu seus guardas até a ilha para investigar (e, obviamente, para caçar também, caso sua intuição se confirmasse). O que eles encontraram foi uma ilha inteiramente mudada. A floresta tinha crescido de forma tão densa da noite para o dia que constatou-se ser praticamente impenetrável, não fosse uma singela trilha bloqueada por obstáculos misteriosos. E, ainda mais misterioso, podiam se ouvir gritos de gelar a alma provenientes de alguma fera selvagem, brados que ecoavam sem cessar
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por toda a floresta. Comenta-se que diversos guardas enlouqueceram imediatamente ao ouvir tais sons e que o próprio Rei Aliphim passou o resto de seus dias assombrado pelo ecoar dos gritos.
Desde aquele tempo, a ilhota adotou o seu novo nome e tem permanecido impenetrada, e imperturbada, em meio às demais ilhas radiantes do reino.
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PARTE VII Lendas e Mitos da Terra das Ilhas Verdes
Ao longo de incontáveis noites passadas por mim em frente à lareira com meus companheiros da Ilha da Coroa, aprendi que os habitantes nativos são famosos contadores de histórias. A meu ver, não há nada que fale mais a respeito de um povo do que os contos que eles proclamam, eis que eles são tecidos com uma intrincada malha de sentimentos que envolvem os medos, as esperanças, e os sonhos de uma cultura inteira. Para a sua inspiração e entretenimento, eu exponho a seguir algumas das mais interessantes lendas e mitos da região.
Ilhas Perdidas e Outros Mundos
Toda terra que se preze tem sua parcela de contos a respeito de lugares escondidos: cavernas perdidas, salas de tesouro subterrâneas, e reinos secretos acessíveis apenas através de uma frondosa árvore de carvalho. A Terra das Ilhas Verdes não é exceção. Aqui, como se pode imaginar, os locais ocultos tomam a forma de ilhas perdidas em meio à névoa e tudo aquilo o que pode por ventura existir nos confins do oceano.
Uma narrativa popular parece refletir os correntes mitos universais em torno do plantio e da colheita. Conta-se a estória de que existe nas proximidades uma ilha habitada por sacerdotes que veneram a Mãe Terra. Esses clérigos seriam responsáveis por manter o clima e as marés em perfeito balanço para garantir a segurança contra furações e outras forças do mar, bem como para assegurar a contínua prosperidade
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do reino. Diz-se que esses padres demandam a privacidade acima de tudo e que eles permanecem leais à Coroa em troca da manutenção de seu segredo. Ah, que estória formidavelmente conspiratória!
Os nativos das Ilhas Verdes também gostam de dizer que as correntes intrasponíveis nos mares ao redor do reino estão lá como um aviso – coibir as embarcações de navegarem adiante em direção ao leste, pois se acredita que, por volta de um dia de viagem marítima nessa direção, qualquer navio forte o suficiente e temerário o bastante para sobreviver às tempestades irá se deparar com o fim do mundo!
“O que jaz além do fim do mundo,” perguntei. “Ora, o próximo mundo,” responderam-me em uníssono, e rapidamente mudaram de assunto.
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Rituais Fúnebres
A morte sempre fascinou a humanidade ao redor da terra, e existem inúmeras filosofias sobre o que haveria depois desta vida, visto que ela, até onde sabemos, é finita. Constatei que os habitantes das Ilhas Verdes compartilham entre si uma intensa fé em comum, uma crença tão arraigada que parece desafiar quaisquer questionamentos.
Os familiares do falecido realizam a cerimônia do funeral alguns dias após a sua morte a fim de permitir à alma do seu ente amado uma passagem segura até o Reino dos Mortos. O finado é então enterrado com as coisas que ele ou ela poderão precisar durante essa longa jornada. O Reino dos Mortos é um lugar que não é deste mundo. Lá impera a Morte em pessoa. Alguns a chamam de O Senhor dos Mortos, outros, de Samhain. Àquela almas que morreram em paz consigo mesmas é assegurada a entrada no Submundo e a sua instalação no Mar das Almas. Naquele repositório seguro, elas serão contempladas com a sabedoria suprema e preparadas para o próximo estágio da existência. Todavia, aquelas almas que morreram com traumas pendentes em suas vidas humanas não poderão adentrar o Submundo, mas sim permanecerão amaldiçoadas a vagar eternamente na superfície do Reino, como que acorrentadas às suas angústias humanas. Algumas vezes,
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os seus problemas de vida acabam por se resolver no mundo real sem a intervenção deles – quando a justiça é feita, ou seus amados encontram a felicidade – e então eles são libertados das amarras que os prendiam e viajam, agradecidos, ao mundo inferior. Mais freqüentemente, porém, as coisas nunca são realmente resolvidas no mundo real e as almas presas, com o tempo, tornam-se parte do exército de mortos descerebrados que marcham eternamente sobre a superfície, nunca a ponto de encontrarem a paz de espírito ou de terem a permissão de seguir em frente.
Esse sistema de crença afeta profundamente as vidas dos habitantes das Ilhas Verdes, e constitui, segundo minha estimativa, o cerne de suas vidas pacíficas e de sua aversão aos atritos e às contendas, à ganância e à ansiedade. Inevitavelmente, à medida que um homem ou uma mulher aproximam-se da velhice ou da enfermidade, ele ou ela esforçam-se para resolver quaisquer pontas soltas em suas vidas que tenham deixado, em preparação para a jornada que os espera.
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Gênios
Em Daventry, a idéia que a classe menos favorecida tinha de um grande conto invariavelmente envolvia um singelo comerciante ou um pobre fazendeiro dando de cara com uma fada-madrinha e, por conseguinte, ganhando uma fortuna de uma hora para a outra. Quantos sonhadores incorrigíveis provavelmente teriam virado incontáveis noites à procura desse tipo de prosperidade instantânea ao invés de colocarem os pés no chão e tomarem o caminho mais longo para atingir esse mesmo fim, o caminho do trabalho árduo e honesto? Hah! Esse é o tipo de conto que este viajante que humildemente vos fala já ouviu por vezes até demais!
Não se pode dizer que aqui na Terra das Ilhas Verdes existam menos sonhadores do que lá, porém eles não falam de fadas, mas sim de gênios, gênios da lâmpada. Um gênio é uma tentação ainda maior para as almas ambiciosas do que uma fada-madrinha de Daventry, visto que um gênio não atende a simplesmente um pequeno favor, ainda que grandioso, e depois desaparece para sempre. Não, um gênio, tal qual um cão fiel, pertence ao seu dono por toda a sua vida – ou, melhor dizendo, por todo o período de tempo que o afortunado “amo” conseguir manter sua posse sobre a lâmpada da criatura.
Ao que parece, todo e qualquer nativo das Ilhas Verdes conhece de cor e salteado todos os prós e os contras dos gênios, muito embora pouquíssimos tenham visto um pela frente. De acordo com as conhecidas “regras”, todo gênio é imortal e cada um deles é permanentemente atrelado a uma dada lâmpada na qual ele pode ou não estar aprisionado por séculos a fio, dependendo tão somente dos
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caprichos do seu mestre ou das intempéries do destino. Uma vez que a lâmpada caia nas mãos de um homem ou de uma mulher, aquela pessoa tornar-se-á mestre do seu respectivo gênio e todos os seus desejos serão para ele como uma ordem. Gênios são seres extremamente valiosos e são capazes de fazer uma variedade de truques, incluindo transportar um homem para qualquer lugar na superfície da terra, tomar qualquer forma que o seu amo puder desejar, e, é claro, o artifício mais popular e que nunca sairá de moda, obter uma enormidade de tesouros e riquezas. Contudo, um gênio apresenta, sim, algumas limitações: não consegue curar doenças, alterar o clima, ou trazer os mortos de volta à vida. E cada gênio sempre tem um ponto fraco particular que o distingue dos outros.
Um gênio também se vincula ao seu mestre de outras maneiras. Diz a sabedoria popular que um gênio é como um espelho; ele só faz refletir a vontade do seu amo. Dessa forma, se o seu mestre for diabólico e cruel, o gênio também o será. Se, por outro lado, o seu mestre for generoso e benévolo, por conseqüência assim será o gênio.
Uma das estórias de gênios mais populares que se tem notícia é o seguinte caso de um gênio conhecido como Mali Mellin.
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A estória de Mali Mellin
Mali Mellin era um gênio com uma curiosa queda por degustar mamonas (muito embora elas fossem altamente venenosas para seres humanos normais). Ele passou alguns milhares de anos aprisionado em uma lâmpada surrada após ter sido enterrado com o seu possessivo amo. Um dia, um pobre fazendeiro desencavou a lâmpada enquanto lavrava o campo. Ignorante como ele era, o fazendeiro tomou a lâmpada e em seguida a deu de presente para sua esposa, e ela, dotada da mesma inteligência rara que a dele, limpou rudemente o exterior da lâmpada sem sequer remover a tampa. O casal levou a lâmpada para vendê-la no mercado por alguns míseros centavos.
A lâmpada acabou por ser vendida a um negociante de antiguidades que, sendo igualmente preguiçoso, nunca se deu ao trabalho de abrir a coisa. (O conto continua essa cadeia da mesma forma, passando a lâmpada de mãos em mãos por uma dúzia de gente, para o hilário deleite dos ouvintes nativos, que pelo visto acham que esta é a maior piada que já escutaram na vida. Mas, prosseguindo...)
Finalmente a lâmpada foi comprada por uma pobre donzela chamada Daltina, que desejava apenas trazer um pouco de luz e calor para sua mãe doente. Daltina levou a lâmpada para casa e finalmente a abriu para
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enchê-la de óleo e colocar um pavio em seu interior. Mas ao invés de poeira, uma nuvem de fumaça se ergueu a partir da abertura da lâmpada e Mali Mellin apareceu. A garota foi tomada pelo medo, mas Mali Mellin enfim conseguiu convencer a pobrezinha de que ela não corria perigo, muito pelo contrário, agora ela poderia ter qualquer coisa que desejasse.
Nos próximos meses, Daltina e sua mãe deixaram de subsistir à margem da sociedade para se tornarem mulheres ricas e bem de vida. Seu humilde lar passou a ser uma fina mansão e seu jardim floresceu imensamente. A moça, com o rubor da prosperidade em sua tez, ficou cada vez mais linda com o passar dos dias. Como não podia deixar de ser, Mali Mellin foi muito bem guarnecido com todas as mamonas que ele pudesse comer. Mas em uma coisa Daltina sempre seguiu o conselho de sua mãe: “Nunca conte a ninguém sobre a lâmpada” - ela avisou - “pois não passamos de apenas duas mulheres sozinhas neste mundo e não seríamos páreo contra aqueles que desejassem roubar nosso tesouro.”
Muitos anos se passaram dessa forma, e Daltina estava feliz. Toda noite Mali Mellin a perguntava: “O que mais você deseja?” e Daltina respondia: “Nada. Já tenho tudo o que poderia desejar.”